terça-feira, 24 de agosto de 2010

Benefícios da Ed.Domiciliar (Parte VII)

Adequação às escolhas morais, filosóficas ou religiosas dos pais
Pesquisas relacionadas à Educação Domiciliar realizadas nos últimos dez anos em países nos quais essa modalidade é legalmente reconhecida têm demonstrado que, dentre todos os benefícios propiciados pelo homeschooling, a flexibilidade que permite a adequação do currículo às escolhas morais, filosóficas ou religiosas da família tem figurado como o segundo principal motivo para se optar por uma instrução dada em casa (o primeiro fica para a insatisfação com a situação do sistema escolar).
Apesar de ser um dos maiores benefícios, este também é um dos temas mais complexos relacionados à Educação Domiciliar. Afinal, há muitos elogios e muitas críticas quando se discute o controle que o homeschooling dá aos pais no tocando ao que será moral, filosófica e religiosamente transmitido a seus filhos.
Por que há essa complexidade ao debater tal tema? Simples: praticamente todos os demais benefícios da Educação Domiciliar são essencialmente objetivos, enquanto esta questão é diretamente subjetiva. Explico: quando tratamos de flexibilidade de currículo/rotina, proximidade da família, naturalização do aprendizado ou avaliação personalizada, tudo isso se mostra como fatos concretos e comprovadamente desejáveis. Esses pontos podem ser observados, quantificados, contabilizados e avaliados objetivamente. Entretanto, a possibilidade dos pais terem controle sobre a formação moral das crianças não é comprovadamente desejável por todos, nem pode ser avaliada de forma quantitativa.
Uma das críticas mais ferozes contra a Educação Domiciliar tem sido, de fato, a possibilidades dos pais imporem seus valores morais e religiosos às crianças, impedindo os sujeitinhos de exercerem sua escolha e optar por uma dentre muitas cosmovisões. Para alguns, o resultado disso seriam crianças segregadas, resistentes ao que é diferente, preconceituosas, “bitoladas” e excludentes.
Não podemos ser tão fanáticos ao ponto de não concordar que há certa razão nesse argumento. Se não houver equilíbrio e sabedoria por parte dos pais-mestres, esse horrível quadro de negação do diferente pode saltar do mundo dos pesadelos diretamente para nossas salas de estar.
Entretanto, cabe problematizar essa questão através de um olhar mais amplo...
E, neste sentido, não podemos deixar de fazer uma rápida comparação entre a Educação Domiciliar e a Educação Escolar. Apesar de ser totalmente contra pautar os argumentos relativos ao homeschooling meramente sobre uma crítica às instituições escolares, desta vez não há como não analisar alguns fatos relacionados a isso. Entretanto, afirmo que o que vem a seguir não é uma crítica à situação da escola em si, mas uma análise de certo fator que faz parte da própria essência da instrução escolar. O próprio texto se justificará, mas não há como mudar o quadro que iremos apresentar – é virtualmente impossível!
No que pesem as críticas ao fato dos pais determinarem que tipo de instrução moral/filosófica/religiosa seus filhos receberão através da Educação Domiciliar, o mesmo ocorre de forma clara quando se trata da Educação Escolar. Seja um professor particularmente, seja a instituição como um todo, ou seja o sistema escolar por inteiro, a instrução escolar sempre irá optar por uma visão específica ao instruir os alunos. Por exemplo: um professor, por mais experiente e capacitado que seja, não conseguirá ser tradicional e escolanovista ao mesmo tempo. Não há como ser tecnicista ou adepto das teorias críticas ao mesmo tempo. Uma dessas visões filosóficas deverá ser escolhida para nortear o processo pedagógico em detrimento das demais – e isso não é errado em si, mas é natural.
Se alguém tentar misturar elementos das várias correntes teóricas e conseguir, com sucesso, criar um amalgama teórico consistente e aplicável à educação, mesmo assim estará optando por utilizar essa sua mescla e não outra, ou seja, também estará utilizando uma única visão filosófica de trabalho.
Além disso, a própria transmissão de conhecimentos não pode ocorrer de forma neutra. E ao dizer “não pode”, não nos referimos a “não dever”, mas à impossibilidade de tal processo ocorrer dessa forma. Com efeito, ao ensinar que as datas são divididas entre Antes e Depois de Cristo (A.C. / D.C.) se está, efetivamente, entrando em terreno teológico. Por mais comum que seja essa divisão histórica, não há como negar que ela advém de visões religiosas. E agora? As escolas deixaram de ensinar essa divisão para não impôr o cristianismo a crianças de origem muçulmana, budista, ateia ou outra qualquer que não reconheça Jesus como figura de autoridade espiritual? De forma alguma...
E, ao se ensinar que a escravidão é algo errado, ruim em sua essência, os professores não estão transmitindo valores morais e éticos? Não se está criando um preconceito contra o modo de produção escravagista?
Obviamente, estou usando esses exemplos, não por ser contra ou a favor de qualquer um dos elementos apresentados, mas os evoquei para demonstrar que o ensino nunca será imparcial. Ele sempre irá transmitir valores e princípios provenientes do educador ou do sistema educacional em si.
Neste sentido, tanto o sistema domiciliar quanto o escolar de educação irão transmitir visões filosóficas, religiosas, morais, etc. A única diferença real entre os dois sistemas é QUEM irá determinar a visão que será transmitida.
Com efeito, se é perigoso os pais escolherem que orientação sexual irão passar para seus próprios filhos, seria menos perigoso deixar tal escolha a critério de um professor, de uma escola ou do Estado? Qual seria a diferença? Essencialmente não seria o mesmo: optar por uma visão que será transmitida ao sujeitinho? E o mesmo se aplica a qualquer instrução: moral, social, afetiva, religiosa, filosófica, etc.
Alguma visão será transmitida, seja pelos pais, seja pelos professores. E, neste sentido, precisamos perguntar: Quem deve escolher a visão a ser transmitida às crianças?
Vejamos o inciso 4 do Artigo 12 deste último documento:


4. Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções.


Inclusive, o inciso 2 do mesmo artigo relata que ninguém pode ser alvo de medidas restritivas que o impeçam de preservar sua religião ou liberdade de consciência.
Já o inciso 1 do Artigo 13 da C.A.D.H. Afirma:


1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.


Essa liberdade de transmitir seus pensamentos não é restritivo (a não ser pela lei, como prevê o inciso 2), o que abriria as portas, inclusive, para a transmissão desses pensamentos aos próprios filhos.
Por fim, o inciso 3 do Artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos enuncia:


3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.


Como podemos ver, em um país regido por esses direitos humanos, os pais devem ser responsáveis por escolher quais valores e princípios morais, filosóficos e religiosos irão reger a instrução de seus filhos. Obviamente o Estado deve sim regulamentar o processo educativo para evitar abusos e garantir que as crianças tenham acesso ao conhecimento sobre visões diferentes das de sua família, entretanto, isso não pode restringir o direito dos pais propagarem sua religião ou seus valores para seus próprios filhos.
Neste sentido, não podemos negar que a diversificação de visões na sociedade é beneficiada pela Educação Domiciliar.
Como?!?! Explico: enquanto uma família transmite suas visões para as crianças, pode parecer que isso “fecha” a possibilidade de mudanças. Entretanto, quando é o sistema escolar que determina quais serão as visões transmitidas, temos um quadro em que toda uma nação deverá se adequar a um padrão preestabelecido de moral, valores, etc. Isto sim é restringir as possibilidades e negar as diferenças: uma nação inteira de crianças sendo ensinadas da mesma forma, com os mesmos princípios, sendo aprovados somente se apresentarem adequação ao padrão mínimo exigido.
Desta forma, podemos perceber que a possibilidade de cada família optar pelos princípios e valores norteadores da educação de suas crianças, ao ser feita de forma correta, sábia e equilibrada, abre uma possibilidade muito maior para a diversificação de visões na sociedade, contrapondo-se à formação “em moldes” e massificada de uma educação exclusivamente escolar1.


Conclusão
Obviamente, os benefícios da Educação Domiciliar vão muito além do que foi apresentado aqui. Porém, acreditamos que esta visão geral das principais vantagens do homeschooling já foi suficiante para demonstrar categoricamente sua riqueza, além de justificar de forma satisfatória sua aplicação.
1 Com isso não pretendemos rejeitar totalmente a educação escolar. Ela tem seu papel e deverá continuar existindo sempre em nossa sociedade. Os problemas surgem quando essa é a única modalidade existente e/ou reconhecida na sociedade.

2 comentários:

  1. 1 - Prefiro falar em ensino doméstico do que em educação domiciliar. Primeiro porque o conceito de educação é mais amplo que o de ensino e (ainda) não se discute que a família tem uma função educativa. O que se discute é se a família deve poder ministrar o ensino fundamental em casa. A educação domiciliar já existe e só poderia deixar de existir com a abolição da família, o que reivindicamos é o ensino doméstico. Mas, ora, se a família tem uma função educativa, por que esta educação não pode ser completa, incluindo também o ensino?

    Ademais, esta distinção de termos vai mais longe, pois só a família educa. A escola pode, quando muito, ensinar.

    2 - Os pais respondem pelos filhos, enquanto estes são menores. Isso é de direito natural. Pela mesma razão, a educação moral e religiosa dos menores é de responsabilidade dos pais. A ONU pode dizer o que quiser, ratificar ou contestar essa lei, mas ela está escrita na natureza das coisas. Os pais respondem pela educação dos filhos não por conta da porcaria de uma declaração de direitos, mas simplesmente pelo fato de os terem gerado.

    3 - Não vejo nada positivo na "diversificação de visões na sociedade". Este é apenas um sintoma da anarquia espiritual do nosso tempo. A verdade, como Deus, é uma só; apenas o erro é pluralista. Se o princípio de não-contradição estiver certo, uma sociedade pluralista é uma sociedade cultural e espiritualmente doente. De outra parte, resta saber se o Estado é a instituição competente para descobrir e impor a verdade, e também se a verdade se impõe pelo poder coercitivo do Estado. A minha resposta é negativa às duas perguntas. Num ambiente de liberdade espiritual provavelmente é mais fácil de se ver resplandecer a verdade, que sob a mentira imposta pelo Estado.

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  2. Obrigado pelo comentário, Rodrigo!
    Pensamos diferente em alguns pontos, mas essa não conformidade de pensamentos promove e qualifica a discussão.
    Aguardo mais participações suas no futuro.

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Agradeço sua participação... ela é muito importante!

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